Atualmente, no
Brasil, existe uma onda de testes de DNA (nos laboratórios
públicos, com dinheiro do Estado, e em clínicas particulares)
que desafia a imaginação. Interlocutores na televisão
fazem prova de sua generosidade pagando o custo do teste para mães
solteiras e maridos ‘descornados’. Cidadãos em
um vilarejo do Nordeste estão organizando consórcios
- cada participante cotizando um tantinho por mês para ter
acesso ao teste. Ouvi recentemente uma música no rádio
em ritmo de samba com o seguinte refrão: “Não
precisa fazer teste de DNA, a criança é a cara de
você”.
O que há (podemos perguntar) por trás de tanto alarido?
Qual a idéia de paternidade sendo expressa aqui? Como que
a tecnologia DNA está influenciando políticas públicas
e leis nacionais pertinentes à vida familiar? E quais as
eventuais conseqüências para atitudes e práticas
na esfera de relações de gênero? Para esboçar
uma resposta inicial a estas perguntas, voltei minhas atenções
para o sistema judiciário do estado de Rio Grande do Sul,
onde concentrei meus esforços, nos anos 2002-2003, nos diversos
setores localizados na capital, Porto Alegre. Lá, encontrei
um número surpreendente de disputas em torno da identidade
paterna – ações movidas na Justiça para
reivindicar ou rescindir o reconhecimento paterno. Já que
a grande maioria de casos é decidida pela tecnologia do DNA,
esse material levanta reflexões interessantes quanto à
interseção das esferas médica e jurídica
e sua influência sobre as relações de gênero
e de parentesco na sociedade contemporânea. Tendo repercussões
profundas sobre a nossa maneira de ‘saber’ quem é
pai, a situação descrita nesse paper também
traz novos desafios para uma antropologia do conhecimento, voltada
para a análise das crenças (inclusive científicas)
ocidentais.
Tecnologia, Gênero e Contexto
O primeiro ponto, e talvez o mais importante desse artigo, é,
portanto, documentar o uso dessa forma particular de tecnologia
moderna – o teste DNA de paternidade – no Brasil contemporâneo.
Ao longo de um circuito de conferências que dei em 2004, descobri
que, fora do Brasil, as pessoas têm dificuldade de imaginar
a enorme popularidade deste teste. Na Argentina, por exemplo, a
tecnologia DNA é associada antes de tudo ao movimento social,
às Madres de la Plaza de Mayo. O teste é
conhecido pela sua utilidade na localização dos filhos
dos desaparecidos (prisioneiros políticos assassinados durante
a ditadura), que podem então ser encaminhados aos avós
biológicos (Martinez 2004). Na Holanda,
o DNA está associado ao trabalho da polícia, para
identificar criminosos que tenham deixado evidências corporais
na cena do crime, ou então, mais tenebrosamente ainda, às
companhias de seguro que procuram evitar os clientes de risco. Quanto
aos testes DNA de paternidade, bem – ouvi de meus colegas
holandeses que, no seu país -- “as pessoas simplesmente
não estão interessadas nesses assuntos”. Finalmente,
em Portugal, parece que o teste DNA é concedido pela Justiça
a umas poucas mulheres sem marido, mas numa escala extremamente
parcimoniosa. Além disso, ele é simplesmente negado
às mulheres “promíscuas”, como as prostitutas,
que, – ao que tudo indica – não têm nenhum
direito de infernizar a vida dos homens sobre a possível
paternidade de seus filhos (Pina-Cabral 2003,
Machado 2004). Em outras palavras, a situação
que descrevo no Brasil – ou seja, a adoção geral
e irrestrita dos testes DNA de paternidade, não apenas por
indivíduos, em nível particular, mas também
pelos planejadores das políticas públicas –
parece sem precedentes.
É minha esperança, portanto, que ao documentar o
uso generalizado dos testes DNA de paternidade no Brasil, trazendo
um exemplo daquilo que alguns poderiam considerar uma importância
exagerada atribuída a esse processo bioquímico, eu
possa contribuir para a reflexão em torno dos usos e da propagação
da tecnologia moderna. Não pretendo “explicar”,
neste trabalho, por que o Brasil se enveredou pelo caminho das investigações
de paternidade – mas espero demonstrar amplamente que a tecnologia,
como a do DNA, não tem o mesmo impacto em todos os lugares.
Os seus usos não são predeterminados. Os seus efeitos
não são automaticamente libertadores – como
muitos (especialmente os donos de laboratórios) gostariam
que acreditássemos, nem significam necessariamente algum
tipo de apocalipse totalitário – uma versão
moderna do Admirável Mundo Novo de Aldous Huxley. É
exatamente o fato de a tecnologia assumir formas variáveis,
de acordo com a rede social (e humana) na qual ela opera, que torna
este tema tão fascinante para cientistas sociais, como eu
mesma (Haraway1991, Latour1999).
Há, no entanto, outro tema transversal muito importante
em minha pesquisa – o dos estudos de gênero e parentesco.
Conforme esses pesquisadores, desde a metade do século, novas
formas de tecnologia reprodutiva têm transformado nossa maneira
de pensar a cisão entre natureza e cultura, trazendo “mudanças
profundas” na conceituação ocidental da família.
Destaca-se o impacto de três descobertas científicas:
1) a pílula contraceptiva, que permitiu cópula sem
concepção 2) a fertilização in-vitro,
que permitiu a gravidez sem cópula, e 3) a barriga de aluguel,
que permitiu a maternidade sem gestação (Franklin
1995, Franklin e Ragone 1998, Strathern
1992 e 1995ª, Franklin e McKinnon 2001).
Afirma-se que, uma vez desfeitas as antigas verdades da reprodução
pela tecnologia moderna, a “perda da inocência”
é irreversível (Strathern 1995a).
Gostaria de sugerir de que houve em anos recentes, uma quarta “revolução”
tecnológica – a aplicação sistemática
da tecnologia DNA na identificação de parentes/pais.
Sugiro ainda que, pelo menos no Brasil -- onde a maternidade assistida
está ainda de uso restrito e onde até a pílula
anticoncepcional tem ampla rejeição (Scavone
2004) – o teste de DNA talvez tenha tido mais impacto
do que as inovações precedentes.
Situo, portanto, minhas reflexões nesse debate entre antropólogos
que questionam a divisão entre natureza e cultura para assim
sublinhar a historicidade de relações classicamente
naturalizadas – maternidade, paternidade e família.
As disputas legais de paternidade compõem um campo interessante
não somente para o estudo da discórdia entre homens
e mulheres, mas também para noções de filiação
e pertencimento familiar. Fornecem rico material para demonstrar
a inseparabilidade dos campos analíticos de gênero
e parentesco, e para analisar “os sistemas culturais dinâmicos
de significados pelos quais diferentes formas de sistemas historicamente
específicos de desigualdade são perpetradas e transformadas”
(Collier e Yanagisako 1987: 15-16).
Localizar os contornos desse sistema “historicamente específico”
não é, no entanto, nunca um exercício fácil,
pois cada contexto traz sua complexidade e contradições.
Como introdução ao contexto brasileiro, iniciarei
aqui pela evocação de uma grande heroína da
literatura brasileira -- Capitu, imortalizada por Machado de Assis
no seu romance novecentista, Dom Casmurro. Com a particular
sensibilidade que o tornou o cronista mais importante da sociedade
de sua época, este autor apresenta Capitu como a esposa adorada
de um homem torturado pelo ciúme. Seu pior temor, o de que
ela poderia ter tido um caso com seu melhor amigo, é exacerbado
pelo comportamento "suspeito” da esposa – uma lágrima
derramada no funeral do suposto amante. Mesmo depois da morte prematura
do rival, Dom Casmurro (o marido) continua envenenando a vida da
mulher, não com acusações abertas, mas com
uma estudada indiferença - dirigida também ao filho
que ela engendrara. A novela termina tragicamente, com a morte de
Capitu (exaurida pelo desdém de seu marido) e com seu filho
em exílio (que desafortunadamente ostenta alguma semelhança
com o falecido amigo do casal). Porém, Dom Casmurro permanece
na memória do leitor como a figura mais trágica de
todas pois se dá conta que ele, e mais ninguém, é
responsável pela destruição de qualquer esperança
sua de felicidade – e tudo por causa de uma vaga dúvida.
Nas mãos deste mestre do conto e do romance, a saga de Capitu
é mais sutil do que muitos escritos acadêmicos sobre
o complexo mediterrâneo da honra e da masculinidade. Não
é minha intenção, todavia, chicotear o cavalo
morto deste debate específico (1).
Antes, preferiria pensar em como a figura de Dom Casmurro, este
marido atolado em suspeitas e tão presente no imaginário
dos brasileiros, combina hoje com um conjunto específico
de circunstâncias políticas e tecnológicas.
Afinal de contas, a força dramática do romance de
Machado de Assis vem do fato de que nem Dom Casmurro, nem o leitor
sabe ao certo se Capitu foi ou não foi infiel, se o filho
dela era do marido ou de um outro homem. Tal dilema, posso garantir,
não faria mais sentido no cenário da família
brasileira contemporânea. Mesmo que a chamada revolução
sexual moderna, com seus ideais de liberdade e de realização
pessoal, não tenha chegado à vida de todos os casais,
o teste de DNA chegou. Se vivessem hoje, no novo milênio,
esses personagens de Machado de Assis, Capitu e Dom Casmurro, saberiam
certamente que podiam dar um fim às suas dúvidas,
através desta forma de biotecnologia.
Criando um produto de consumo popular
Eles poderiam eliminar a dúvida, mas a questão é
se fariam isso. Certamente, como no caso de outros itens de consumo
(de novas tecnologias reprodutivas a pasta de dentes), o desejo
de usar tal tecnologia depende de vários fatores, inclusive
marketing, percepção de necessidade e acessibilidade.
O marketing foi promovido, no Brasil, não apenas pela mídia,
mas também por setores específicos da comunidade científica.
Por volta de 1989, mal passados cinco anos da “descoberta”
da técnica (por Alec Jeffreys) na Universidade de Leicester,
Inglaterra, um grupo de pesquisadores em Belo Horizonte, Brasil,
já trabalhava com refinadas “impressões digitais”
genéticas, reduzindo a quase zero a margem de erro nas investigações
de paternidade (ou seja, com a anunciada chance de erro de 0,00001).
A tremenda fé dos cientistas em tais testes fica bem clara
num artigo de Sérgio Pena, um dos principais pesquisadores
desta área no país. Depois de descrever os métodos
tradicionais usados pelas cortes de justiça para determinar
a paternidade de um homem (com base em declaração
de testemunhas) Pena conclui: “Porém […], nós
acreditamos que para determinar a paternidade, a evidência
baseada em testemunhos deveria ser tomada com um grão de
sal porque […] a concepção ocorre no interior
do corpo de uma mulher, o que elimina a possibilidade de ser testemunhada.
Logo, a única maneira realmente eficiente de provar a paternidade
é através de investigações técnicas,
para ser exato, através de exames de DNA” (Pena s/d:
3). Este cientista possui, em todas as grandes cidades brasileiras,
laboratórios comerciais especializados em testes DNA de paternidade.
A certeza dos cientistas alimenta as esperanças de legisladores
que vêem no teste de DNA uma possível solução
à pobreza endêmica de tantas famílias brasileiras.
Há deputados que citam números sobre a triste situação
econômica de famílias chefiadas por mulheres e, em
seguida, evocam a crença muito comum (e errônea) de
que um terço das crianças nascidas no Brasil não
têm pai na certidão de nascimento. A partir daí,
tentam dar a entender que bastaria pôr um homem na família
dessas crianças para sanar a maioria dos problemas sociais
e econômicos da nação. É desnecessário
dizer que essas políticas coincidem com o senso comum e –
entre outras coisas – geralmente garantem, na eleição
seguinte, certo número de votos aos legisladores que as apóiam.
Não deixa de ser irônico, num país onde um quarto
das pessoas vive com menos de dois dollars por dia, em que faltam
verbas públicas para estender a toda a população
serviços básicos de saúde e saneamento,(2)
que políticos investem tanta energia em garantir o direito
universal ao teste de paternidade DNA.
Os testes de DNA, que custam entre $200 e $700 dólares cada
um, não são exatamente baratos (3).
Na verdade, pode-se presumir que os testes de paternidade tornaram-se
um negócio extremamente lucrativo para gente de iniciativa.
Assim que, em 1999, o estado de São Paulo alocou cerca de
três milhões de dólares anuais para testes de
DNA, os laboratórios privados começaram a disputar
contratos com laboratórios públicos. Para diminuir
a lista de espera que incluía 13,500 famílias, o Instituto
de Medicina Social e Criminologia (IMESC), gerido pelo Estado, planejava
expandir suas instalações para realizar até
mil testes por mês. No estado do Rio Grande do Sul, onde fiz
minha pesquisa de campo, a Universidade Federal foi contratada para
fazer os testes por um preço ligeiramente inferior ao do
mercado. Durante a segunda metade de 2002, o sistema judicial do
estado registrou cerca de mil novas demandas por mês –
perto de 7% do volume mensal de nascimentos (4).
Marcando 500 testes por mês, o Serviço Médico
Judicial tinha de trabalhar com enormes listas de espera –
mais de 8,000 casos – obrigando as pessoas envolvidas a esperar
até 20 meses.
Tanto investimento público nos testes não faria sentido
se não estivesse a serviço de uma autoridade oficial
que sabe fazer uso dos resultados. Assim, vale a pena considerar
a evolução de leis de paternidade durante o último
século. Durante a primeira metade do último século,
filhos “naturais”, fruto ilegítimo de uniões
consensuais ou de casais cuja relação não estivesse
legalmente oficializada, haviam conquistado certo terreno -–
no que diz respeito ao direito de reconhecimento da paternidade
e da reivindicação dos direitos de herança.
No entanto, foi somente a partir de 1949 que a lei 883 permitiu
a um homem casado reconhecer a criança nascida de
uma relação extraconjugal e, mesmo então, apenas
depois da dissolução legal (desquite) do seu casamento.
Esta lei permitiu à criança nascida de uma relação
adúltera mover uma ação de reconhecimento de
paternidade contra o seu reputado pai. Contudo, mesmo após
o reconhecimento oficial de um vínculo de parentesco, a criança
de uma relação extraconjugal (assim como a criança
adotada) somente poderia reivindicar bens e valores que não
ultrapassassem a metade do montante normal de um herdeiro “legítimo”.
Esta forma de discriminação contra os filhos de relações
extra-matrimoniais esvaeceu com a lei do divórcio de 1977.
Esta assegurava que, uma vez reconhecido em testamento fechado,
o vínculo filial era irrevogável, e tal filho teria
plenos direitos de herança. Contudo, foi apenas com a constituição
de 1988 que o princípio da igualdade entre todas as crianças
se tornou imperativo. Hoje é absolutamente irrelevante sob
quais condições um casal concebeu seu bebê.
Em qualquer caso, a criança terá direitos iguais àqueles
de qualquer progenitura “legítima” nascida desta
mãe ou daquele pai. Além disso, desde 1992 a lei n°
8560 reforça a igualdade de direitos das crianças
nascidas de relações extra-matrimoniais, decretando
a assistência pública para investigações
no caso de pais relutantes e proibindo a menção discriminatória
de “legítimo” ou “ilegítimo”
na certidão de nascimento de uma pessoa. Como Bilac expressa,
“da perspectiva do direito [...] os homens nunca foram tão
responsáveis por sua reprodução biológica
como no presente momento de nossa história” (1999:
19).
As leis, no entanto, assim como a tecnologia globalizada, têm
impacto que varia conforme o contexto e as circunstâncias
em que são aplicadas. Devemos perguntar se mulheres e crianças
beneficiam-se ou não dessas leis e, mais especificamente,
se o teste DNA de paternidade funciona contra ou a favor delas.
A pesquisa de campo
Para realizar uma observação etnográfica da
prática da lei (Moore 1978), concentrei
meus esforços na capital do estado, Porto Alegre, onde acompanhei
processos legais de paternidade. Segui os usuários do sistema
público, desde o primeiro contato na Defensoria, e as tentativas
de conciliação no Fórum Central, até
a sala de coleta de sangue no Tribunal de Justiça e as sentenças
finais na Vara de Família. (5)
A observação de uma manhã rotineira no Serviço
Médico Jurídico revela uma circulação
intensa de clientes. Vão chegando homens e mulheres dos quatro
cantos do estado: a moça guarani da fronteira, a colona da
serra, a moradora de rua do litoral... Para muitas pessoas trata-se
da primeira visita à capital. Chegam de madrugada, depois
de sete ou oito horas de viagem, e vão embora com o ônibus
do meio-dia. Algumas mulheres conseguem uma ajuda da prefeitura
para pagar a passagem. Vêm escoltadas por uma assistente social,
um advogado interiorano, algum parente ou até um companheiro...
todas trazendo filhos a reboque. Com recém-nascidos no colo
de suas mães e bebês engatinhando pelos corredores,
a sala de espera tem ambiente de creche. (6)
Entre os filhos de pai desconhecido, ainda aparecem adolescentes,
alguns dos quais tomaram a iniciativa eles mesmos de localizar o
genitor. Os supostos pais, vindos em geral sozinhos, parecem pouco
à vontade. São eles que ocupam as cadeiras mais afastadas
da secretaria, ou que ficam em pé, às margens da cena.
Alguns deles, ostentando seu status de brigadiano ou militar
(fardados viajam de graça no ônibus intermunicipal),
demoram em responder à chamada. “É como se tivessem
vergonha”, comenta para mim a recepcionista. “Às
vezes tenho que chamar duas ou três vezes antes que se manifestem.”
Em todo caso, a cena nessa sala de espera não deixa dúvidas
quanto ao alcance do teste. O impacto dessa nova tecnologia chega
aos lugarejos mais interioranos e a todas as classes sociais.
No clima dessa sala de espera, parece evidente que, aqui, trata-se
de mulheres e crianças arrancando de ex-companheiros e pais
o cumprimento de seus direitos familiares. Se esses esforços
surtem ou não efeito está a ver. Muitos casos nunca
chegam a ser julgados. Alguns processos são arquivados porque
ninguém conseguiu localizar o suposto pai. Mesmo quando localizado,
é comum o homem não comparecer à primeira convocação
para fazer o exame de sangue. Existe uma norma no judiciário
estadual que o homem que não comparecer depois de três
convocações é declarado pai à revelia
(7) – mas uma mulher pode
cansar de ‘caminhar’ depois ir uma ou duas vezes ao
Serviço Médico sem resultados. Um filho, quando maior,
também pode resistir em enfrentar o encontro com seu suposto
pai – um desconhecido. Com tantos motivos para uma pessoa
desistir, não é surpreendente que, em um levantamento
sobre 20 dias do Serviço Médico, constatamos que cerca
da metade dos exames não foram realizados porque um dos envolvidos
não compareceu. , não obstante o otimismo que circunda
o teste DNA no Brasil, mais eu avançava nas minhas pesquisas,
mais cresciam dúvidas sobre os benefícios do teste.
Encontrei, durante minha pesquisa, uma grande variedade de situações:
disputas envolvendo jovens solteiras e suas namoradas, homens casados
e suas amantes, homens “amigados” que renegavam em registrar
seus recém-nascidos, ex-maridos que queriam evitar de pagar
pensão alimentícia. Entretanto, todos os casos apontam
para o caráter eminentemente social (e não biológico)
do sentimento paterno, pois passa, antes de tudo, pela relação
que o homem tem com a mãe da criança (ver também
Arilha 1998). O sangue conta, sim –
tanto que a paternidade ‘social’, na maioria dos casos,
se calca na crença de uma relação biológica.
No entanto, há homens que, por não ter afinidades
com a mulher, rejeitam qualquer relação com o filho;
e, contrariamente, existem homens (em particular padrastos) que
assumem o status paterno, mesmo sabendo que não
existe fundamento biológico nenhum para essa relação.
Ao que tudo indica, a biologia nunca foi o sine qua non
da paternidade -- certamente não da perspectiva dos homens.
Ao constatar a maneira curiosa em que as pessoas usam a lei para
driblar a ambigüidade entre natureza e cultura na relação
pai-filho, e como a lei é ajustada para se adaptar a novas
situações, comecei a ver que os processos tinham a
ver com dúvidas masculinas tanto quanto com reivindicações
femininas. Tendo rompido (ou nunca iniciado) a relação
de casal, esses homens procuravam no teste de DNA uma justificativa
para repensar um outro vínculo (de filiação),
visto, evidentemente, como subsidiário da relação
conjugal.
Proponho me concentrar no restante desse artigo nesse lado menos
comentado dos testes de paternidade – a possível maneira
em que a tecnologia tem exacerbado dúvidas masculinas quanto
à paternidade. Pois, se, por um lado, o teste pode ser usado
para firmar um laço de parentesco, por outro lado, pode ser
usado para negar laços já existentes. Isto é,
pode servir tanto na investigação quanto na contestação
da paternidade.
A paternidade em questão
Pregada na parede da Defensoria central de Porto Alegre, atrás
da mesa dos defensores, um recado esclarece dúvidas dos profissionais:
– Ação de Anulação de Reconhecimento
de Filho – Hipótese de alegado erro.
Não se trata aqui de revogação do reconhecimento,
mas sim, da hipótese de erro. Não há que invocar
aqui a irrevogabilidade do reconhecimento.
Irrevogabilidade ocorre na hipótese daquele pai que mesmo
sabendo que não é pai, e tendo perfeita consciência
disto, faz o registro da criança como seu filho e depois
pretende desfazer o reconhecimento, e é a esse pai que temos
negado a ação.
Este trecho da sentença de um juiz fala de diferentes tipos
de paternidade – alguns legalmente revogáveis, outros
não. Nosso desafio é decifrar e contextualizar o pequeno
parágrafo, para que ele nos fale não somente da resposta
jurídica, mas também da demanda que os usuários
estão apresentando aos serviços do Estado.
Pais/padrastos na adoção
à brasileira...
Falemos primeiro “daquele pai que mesmo sabendo que não
é pai, e tendo perfeita consciência disto, faz o registro
da criança como seu filho”. Quem faz isso? Nove vezes
em dez é o novo companheiro de uma mãe solteira. Em
outras palavras, o homem que seria normalmente conhecido como ‘padrasto’
escolhe conscientemente a identidade de ‘pai’. Alguns
fazem isso na época de seu casamento, mas muitos não
chegam a casar. Neste caso, parece que registrar o filho da companheira
quase que substitui o casamento, servindo para marcar a nova aliança
entre homem e mulher. (8) Em
todo caso, trata-se daquilo que os juizes rotulam como ‘adoção
à brasileira’ – um ato inteiramente ilegal, uma
forma de ‘falsidade ideológica’, passível
de multa e pena de prisão. Apesar de ser um procedimento
bastante comum, não encontrei um só caso de punição.
Pelo contrário, nos processos consultados, os advogados costumam
se referir à ‘evidente nobreza de espírito’
que move um homem a assumir, dessa forma, a identidade paterna.
Encontrei exemplos de adoção à brasileira
em todos os espaços por onde transitei. Na sala de espera
da Defensoria, uma moça que veio processar o (suposto) pai
de seu nenê tece elogios ao sentido de responsabilidade de
seu próprio pai:
Minha mãe ganhou meu irmão
antes de mim, mas o pai dele não registrou. Só foi
registrado dez anos mais tarde, quando minha mãe se juntou
com meu pai. Aí meu pai registrou. Meu irmão já
tinha idade de dizer se queria ou não. Queria, e meu pai
também. A minha mãe chegou a dizer para ele: “Ah,
fulano aí é teu pai...” Mas meu irmão
dizia que não era coisa nenhuma, que pai era quem criou ele.
ele quase não deu bola. (Ana Lúcia, (9)24
anos, afro-brasileira, trabalha como babá sem carteira assinada.)
É interessante notar que, em diversos países ocidentais,
boa parte das adoções legais são efetivadas
por cônjuges querendo legalizar sua relação
paterna ou materna com o rebento de seu esposo. Apesar de ser permitido
pela legislação brasileira, tal procedimento é,
na prática, raro no Brasil. Minha impressão é
que os padrastos brasileiros não assumem menos essa paternidade,
mas que eles tendem a formalizar seu laço com o enteado de
maneira ilegal – pela ‘falsidade ideológica’,
ou seja, pela adoção à brasileira.
Há motivo para pensar que não são poucas as
adoções à brasileira efetuadas por padrastos
no Brasil (ver Fonseca 2002, Abreu 2002). Uma maneira para detectar
esses casos surge justamente quando os pais declarados procuram,
depois de uma separação conjugal, voltar atrás,
negando sua paternidade por via de um teste de DNA. Nessas circunstâncias,
o que faz o tribunal? Tal paternidade é revogável
ou não? O primeiro artigo da chamada Lei de Paternidade (8.560/92)
de 1992, reza que “O reconhecimento dos filhos havidos fora
do casamento é irrevogável...” Ponto final.
Não há prevista nenhuma ressalva que abra para esse
tipo de pai declarado a possibilidade de voltar atrás. Tem
status semelhante ao de pai adotivo: escolheu essa condição,
vai ter que arcar com as conseqüências. O Novo Código
Civil (Lei 10.406, de 10 de janeiro de 2002) guardou ipsis litteris
essa clausula.
No entanto, existe uma diversidade de referências legais
a partir das quais um juiz pode formular sua decisão. Assim,
ao olharmos para a evolução da legislação
no tocante a filhos havidos ‘na constância do casamento’
constatamos uma tendência de facilitar cada vez mais a contestação
da paternidade. De acordo com o Código Civil Brasileiro de
1916, um homem casado era legalmente pai dos filhos de sua mulher
se estes fossem nascidos nos 180 dias subseqüentes ao casamento
ou nos 300 dias seguindo a dissolução conjugal. Qualquer
criança nascida antes dos 180 dias depois do casamento era
presumidamente do marido se ele soubesse que a mulher estava grávida
por ocasião do casamento ou se ele voluntariamente registrasse
o filho em seu nome. Se o casal vivesse sob o mesmo teto, o adultério
da mulher (nem mesmo com sua ‘confissão’) não
seria o bastante para contestar a paternidade de seu filho. Os únicos
fundamentos para a negação da paternidade (e, mesmo
então, havia um limite de dois meses após o nascimento
da criança para efetuá-la) eram a impotência
completa ou a separação prolongada em residências
separadas (Código Civil, artigo 340).
Em 1943, a Lei 5.860 ampliou as possibilidades de contestação
com o seguinte acréscimo (em itálicos) ao artigo 348:
“Ninguém pode vindicar estado contrário ao que
resulta do registro de nascimento, salvo provando-se erro ou
falsidade do registro”. De forma significativa, o Novo
Código Civil (2002) mantém esta ressalva ao mesmo
tempo em que elimina as restrições tradicionais. Agora,
um homem pode contestar a paternidade de um filho sem ter que comprovar
a impotência absoluta e sem preocupação de prazo:
Art. 1.601: Cabe ao marido o direito de contestar a paternidade
dos filhos nascidos de sua mulher, sendo tal ação
imprescritível.
Não pode haver dúvida quanto à relação
entre o teste DNA de paternidade e essa última mudança
da legislação outorgando ao homem o direito praticamente
irrestrito de contestar a paternidade dos filhos havidos durante
o casamento. Vide a seguinte sentença, dada por um juiz do
Superior Tribunal Federal em 1999:
As normas jurídicas hão
de ser entendidas, tendo em vista o contexto legal em que [são]
inseridas e considerando os valores tidos como válidos em
determinado momento histórico. Não há como
interpretar-se uma disposição, ignorando as profundas
modificações por que passou a sociedade, desprezando
os avanços da ciência e deixando de ter em conta as
alterações de outras normas, pertinentes aos mesmos
institutos jurídicos. Nos tempos atuais não se justifica
que a contestação da paternidade, pelo marido, dos
filhos nascidos de sua mulher, se restrinja às hipóteses
do artigo 340 do Código Civil, quando a ciência fornece
método notavelmente seguros para verificar a existência
de vínculo de filiação...(10)
É, portanto, interessante notar que, se em certas circunstâncias
houve um movimento na direção da irrevogabilidade
do reconhecimento paterno para filhos havidos fora do casamento,
houve uma evolução no sentido inverso no que diz respeito
à contestação de paternidade de filhos (que
até 1992 teriam sido denominados) ‘legítimos’.
A adoção à brasileira cai tecnicamente na primeira
categoria, pois se trata da declaração de filhos extraconjugais.
Assim, como vimos no aviso na parede, nessa defensoria, existe uma
orientação para desencorajar a contestação
desse tipo de pai. A única exceção a tal política
diz respeito aos casos em que o pai declarado vem acompanhado do
suposto pai biológico, procurando efetivar uma troca de nomes
na certidão da criança. Neste caso, invoca-se o ‘interesse
da criança’, que ‘tem o direito de saber quem
é o verdadeiro pai’, e toma-se cuidado para acoplar
ao negatório um processo de investigação de
paternidade que nomeia o novo pai (11).
A ‘absoluta prioridade’ que deve ser legalmente atribuída
aos direitos da criança (Estatuto da Criança e do
Adolescente, artigo 4º) abre a porta para novas leituras sobre
a filiação legal. Aproveitando-se da imensa variedade
de interpretações possíveis quanto ao ‘melhor
interesse’ da criança, um advogado pode pretender que
a irrevogabilidade do status paterno é prejudicial
ao filho. Assim, o direito da criança de saber ‘a
verdade’ sobre suas origens pode ser invocado para acobertar
o desejo de um homem (que se trata do marido legal da mãe
ou não) desfazer o vínculo pai–filho.
Dúvidas dos ex-companheiros
João Vitor, 29 anos, formou-se torneiro mecânico,
mas ganha a vida transportando objetos e pessoas na sua mini-van.
Conheci-o na Defensoria estadual, onde ele esperava na fila para
pedir um teste de DNA. Depois de oito anos de casamento, separou-se
da mulher, e queria ‘tirar uma dúvida’ sobre
a paternidade de sua filha, já com quase seis anos.
João Vitor mora com seus pais, donos de uma lavanderia no
centro de Porto Alegre. “Nós que criamos minha filha”,
ele me explica – mas, logo, acrescenta que a criança
passa a metade da semana com a mãe dela. Garante-me que,
seja qual for o resultado do teste, “não vai fazer
diferença, vamos continuar igual como estamos”. Porém,
insiste muito no seu direito de saber: “Só quero tirar
uma dúvida. Não quero viver com essa dúvida
pelo resto da minha vida. Não sei por que [aqui na Defensoria]
eles pedem tanta coisa. É meu direito saber”. Eu sugiro
que é por causa do preço do teste, e ele responde:
“Ah, para pagar político, eles têm dinheiro,
tiram dinheiro de nós, vai imposto por qualquer coisa, mas
para garantir os direitos da gente, está em falta!”
Com toda certeza, eu não teria conhecido João Vitor
se tivesse ficado apenas no Serviço Médico ou mesmo
na Vara de Família – isto é, nas etapas mais
avançadas da investigação de paternidade. Os
casos como o dele não vão em geral além da
Defensoria – os defensores explicam para homens descasados
que ‘seria difícil’ o juiz acatar esse tipo de
negatório sem que houvesse outro ‘pai’ pronto
para assumir seu lugar na certidão. , tudo que João
Vitor conseguiu no local foi um ofício de encaminhamento
para a Santa Casa, onde ele teria de pagar em torno de US$ 160 (um
preço de convênio) para realizar um exame com tecnologia
considerada menos precisa (HLA).
Na verdade, muitas das petições iniciadas por mulheres
revelam histórias semelhantes à de João Vitor
– falam de homens que, apesar de terem vivido durante longos
anos com uma companheira, questionam a paternidade dos filhos que
criaram. A diferença é que João Vitor era legalmente
casado com sua mulher e, assim, era automaticamente o pai presumido
de sua filha. No caso de 20% da população que vive
em união consensual, a filiação paterna não
é automática; deve ser voluntariamente declarada pelo
pai – o que significa, na prática, que depende dos
poderes de persuasão da mulher. A ex-mulher do jardineiro
Eloi, por exemplo, exigiu que ele declarasse seus três filhos,
nascidos durante quase 15 anos de convivência. Ele contestou,
dizendo no processo que: “não nega que viveu com [ela],
e portanto não concorda com a alegação de que
não quis reconhecer seus filhos. Ocorre que [ele] não
reconheceu os filhos [...] como filhos, pois nunca teve certeza
da paternidade” (ênfase minha). Considerando o
homem de renda modesta, o juiz concedeu assistência gratuita,
com benefício do teste de DNA, que, por três vezes,
deu resultado positivo. É interessante que, apesar de ouvir
testemunhas e receber ampla prova da convivência conjugal
desse homem com a mãe das crianças, o juiz ainda exigiu
uma ‘prova contundente’ (isto é, o exame de DNA),
antes de declará-lo pai delas.
Mesmo em situações em que o homem está realmente
a ponto de assumir – por exemplo, o caso de um senhor que,
ao constatar a incrível semelhança física entre
ele e seu filho, já tinha feito um acordo amigável
com sua ex-namorada – as pessoas ainda chegam diante do poder
público com a mesma demanda: “Se tiver direito [ao
teste], eu quero”. Em resposta à demanda desses indivíduos
– mulheres reclamando o reconhecimento paterno para seus filhos
‘de pai desconhecido’ e homens solteiros querendo ‘tirar
uma dúvida’ – os operadores das varas de família
tendem a conceder assistência jurídica gratuita com
bastante facilidade. Agindo sem dúvida com espírito
democrático, querendo garantir direitos iguais a todos que
chegaram até esse ponto, é raro que neguem o pedido
por um exame pago pelo Estado. Ao que tudo indica, quando se trata
de estabelecer um vínculo paterno legal para uma criança
que até então não tinha nenhum, já virou
quase rotina mandar fazer o teste de DNA. Existe uma aceitação
tácita da ‘normalidade’ de o homem exigir esse
‘direito’, deixando a ciência decidir os fatos,
antes de ele assumir um compromisso tão sério.
Contudo, o poder público não trata todas as demandas
da mesma forma. Como vimos no caso de João Vitor, mesmo se
tecnicamente a lei favorece a contestação do homem
casado, o sistema judiciário aciona mecanismos para desencorajar
esses Dom Casmurros da época contemporânea, obrigando
a grande maioria deles a pagar o preço do teste de DNA em
um dos cinco laboratórios particulares locais. É só
depois de eles voltarem com resultado negativo que os defensores
acatam sua demanda, ajuizando o processo e mandando-o para o Fórum.
É nesse momento que é invocada, ao lado do ‘direito
de a criança saber’, ‘a hipótese de erro’,
citada na nota pregada à parede da Defensoria. Contrariamente
à questão de ‘falsidade’, ‘a hipótese
de erro’ diz respeito a casos em que o homem ‘errou’
em boa consciência – subentendendo-se que foi enganado
pela mulher.
Para entender as conseqüências sociais e emocionais
de tal processo, proponho agora narrar um último caso que
presenciei durante a pesquisa de campo.
Uma trajetória paterna: de grande
alegria a dúvidas atormentadoras
Verão de 2002. Estou no sétimo andar do Fórum
Central, na sala reservada especialmente para possíveis ‘conciliações’
ligadas a processos tramitando na Vara de Família. A sala
é pequena. Na frente de três mesinhas que formam uma
letra ‘U’, mal tem lugar para as quatro cadeiras enfileiradas
contra a parede para eventuais espectadores que nem eu. À
direita, esperam as cadeiras do ‘réu’ e de seu
advogado (ou defensor); à esquerda, as do ‘requerente’
com seu advogado. O juiz e o promotor sentarão na nossa frente,
um grau acima dos outros participantes da cena e um grau abaixo
de (um retrato de) Jesus Cristo. Num canto, atrás de seu
computador, o escrivão puxa documentos relevantes ao próximo
litígio.
Essa manhã, noto que o escrivão e a promotora (chegada
agora para iniciar a sessão), estão particularmente
tensos, e acabam trocando comentários sobre o próximo
caso. Já viram muitas outras ‘investigações
de paternidade’ – de jovens recalcitrantes, de homens
casados, de parceiros que abandonam o lar sem nunca ter casado nem
registrado os filhos – mas esse caso é diferente. Trata-se
de um homem que, depois de ter se comportado durante 12 anos como
pai exemplar, está pedindo para anular a certidão
de nascimento de seu filho, apagando seu nome do registro. Que tipo
de homem faria isso?
Estou levemente surpresa ao ver entrar na sala de audiências
um quarentão -- grande, mas de jeito tímido, usando
óculos à la John Lennon. Exala um ar não de
triunfo, mas de tragédia. Calado, toma seu lugar ao lado
de sua advogada, em frente à mãe de seu filho e o
advogado dela. Enquanto esperamos a volta do juiz (que, hoje, atende
simultaneamente em duas salas contíguas, uma audiência
em cada quinze minutos), folheio o processo, inteirando-me dos fatos
básicos do caso tal como esse pai renegado, junto com seu
advogado, os apresentam.
Alceu, o homem em questão, é um carpinteiro aparentemente
bem-sucedido que mora em um bairro de classe média. Frisa,
no seu processo, que o nascimento desse filho foi motivo de grande
alegria para ele e toda sua família. Apesar de nunca ter
vivido com sua companheira (alegando ‘o mau gênio’
dela), mantinha estreitos contatos com o filho, levando-o freqüentemente
a passear junto com os avós e outros parentes paternos. Os
anos foram passando, o menino cresceu, e Alceu constituiu uma nova
família. Até que um dia, revendo os álbuns
de família e notando a falta de semelhança entre o
menino e qualquer parente seu, « foi cogitada a idéia
de que o menor talvez não fosse seu filho legítimo
(...) Infelizmente, nesses casos e no nosso próprio dia-a-dia,
sempre tem uma tia, uma vizinha ou uma prima que sabe de alguma
coisa do passado » . A dúvida passou a atormentar Alceu
durante noites a fio até que, finalmente, com dinheiro poupado
de seus parcos recursos, aproveitou um dos passeios semanais com
seu filho, já com 11 anos, para fazer um teste de DNA. O
resultado negativo constatado pelo laboratório particular
deu origem a um primeiro processo.
Na escrita de sua petição sobressai a angústia
de todo o círculo familiar de Alceu. Aprendemos que, quando
os pais e familiares do suposto pai souberam do resultado, “foi
terrível, não aceitaram o óbvio, e foram veementes
ao afirmar que o teste de DNA só podia estar errado, que
o laboratório não era confiável, enfim, usaram
todo o tipo de argumento para tentar negar a realidade”. Ainda
mais, a mãe do menino insistia com toda convicção
de que não havia namorado ninguém naquela época
além de Alceu e que o resultado só podia estar errado.
Tamanha foi a oposição que Alceu acabou desistindo
desse primeiro processo. Passou quase um ano antes de ele voltar
para o tribunal. Agora está determinado a levar adiante seu
caso, inclusive com resultado (mais uma vez negativo) de um novo
teste de DNA encomendado pelo tribunal.
Os argumentos do processo carregam nos valores convencionais, sem
dúvida para ressaltar o ultraje perpetrado contra o autor.
Contudo, a linguagem acaba por convencer o leitor de um sofrimento
que vai além de frases de efeito:
Realmente a questão é dramática e extremamente
difícil pois não se trata apenas de direitos e obrigações,
mas principalmente de sentimentos. Ainda que haja afeto entre pai
e filho, agora também está presente o sentimento de
traição e vergonha, de humilhação...
Ora, é certo que a criança não tem culpa de
nada, mas e o autor [Alceu], será que alguém pensa
como ele se sente no seu íntimo, sendo enganado durante todos
esses anos, acreditando ter um filho que não é seu?
“Bem”, a promotora rompe o silêncio, trazendo-me
de volta para a cena do tribunal : “Será que tem possibilidade
de um acordo?” Sua pergunta parece sem convicção.
Frente ao mutismo das partes, a promotora, sem ânimo, esboça
alguns argumentos para suspender o processo: “Trata-se de
um menino de 12 anos que está perdendo a família...
Existe um claro conflito de interesses entre o menino e seu pai...
O menino está sendo penalizado por um ato que não
é da responsabilidade dele...” Frases respondidas com
a simples afirmação da advogada de Alceu: “O
menino tem direito de saber quem é o verdadeiro pai”.
Evidentemente, seu argumento não convence a todos. A advogada
da mãe sublinha que, como seqüela do processo, o menino
está em tratamento psicológico, ao que a promotora
responde, em um suspiro apenas perceptível: “Só
pode”. O aparente desconforto de Alceu sugere que nem ele
acredita na alegação de sua advogada.
A mãe do menino não abre a boca; seu ex-companheiro,
idem. O clima de velório não muda com a chegada do
juiz. Pairando sobre todo o procedimento fica a ‘realidade’
de dois testes de DNA, ambos com resultados negando a paternidade
de Alceu. Todos os outros argumentos parecem pro forma,
decretando o retorno de um silêncio desconfortável.
É como se o teste dissesse tudo... “O menino tem direito
de saber quem é o verdadeiro pai” soa como verdade
moral. Contudo, nesse caso, a tecnologia do DNA está sendo
usada não para elucidar quem é o pai, mas –
antes – para dizer quem não é. E fica no ar
a pergunta se alguém sai realmente ganhando.
Olhares cruzados sobre parentesco
e paternidade na época contemporânea
Houve, no fim do século XX, um avanço nas ciências
biomédicas que iria transformar a maneira como nós
ocidentais concebemos o mundo. Na década de 1960 a pílula
anticoncepcional foi popularizada, contribuindo para a consolidação
de uma noção de sexualidade independente da concepção/reprodução.
Foi também nessa época que as novas tecnologias reprodutivas
deram um pulo, chegando, nas décadas seguintes, a abalar
as concepções convencionais de reprodução.
Com o primeiro bebê de proveta, ficou evidente que relações
sexuais não eram a condição sine qua non
da concepção. Com a ‘barriga de aluguel’,
tornou-se possível duas mulheres (uma com o óvulo
da outra implantado no seu útero) serem parceiras na procriação
de um filho. Hoje, com a maternidade assistida, uma mulher pode
ser mãe de sua própria irmã. E com as cirurgias
transexuais, as autoridades estatais estão procurando maneiras
para classificar aquele pai que passou a ter um sexo feminino legal.
Em outras palavras, os princípios ‘básicos’
da procriação – a seqüência inevitável
das gerações e a complementaridade sexual dos genitores
– não se mantêm mais, pelo menos não na
sua forma original. Na visão de mundo da maioria dos ocidentais,
a biologia não deixou de existir, mas – constantemente
mexida pela intervenção humana – deixou de ser
um dado bruto, que existe fora ou anterior à cultura. A cultura
não é mais vista como uma força que opera a
partir de (e sobre) uma natureza dada ou fixa (Stolcke
1986, Strathern 1992, 1995a
e 1995b; Franklin e McKinnon 2001).
Entretanto, paradoxalmente, apesar da percepção de
uma procriação assumidamente ‘man-made’,
permanece mais forte do que nunca a idéia de que o parentesco
é algo concreto, empiricamente demonstrável –
através, por exemplo, do DNA.
Não por acaso, houve, nessa mesma época, uma revolução
na maneira em que antropólogos trabalhavam com a noção
de família. Até então, os analistas tinham
calcado suas análises em uma concepção genealógica
de parentesco. A procriação sexuada era vista como
o cerne de um sistema em que o sangue simbolizava a proximidade
ou distância entre um indivíduo e seus parentes. Da
mesma forma que a família conjugal – composta de um
casal heterossexual e seus filhos biológicos – era
‘inscrita na natureza’, o parentesco, concebido como
irradiando em círculos concêntricos, de um ‘núcleo’
familiar até os primos mais afastados, era visto como algo
universal, comum a todas as sociedades humanas. A revolução
ocorreu em um clima de reviravolta epistemológica, quando
os antropólogos voltaram seu olhar para sua própria
sociedade e, por extensão, para sua própria ciência.
Surgiu então a dúvida, que em pouco tempo tornou-se
convicção generalizada, de que as noções
de ‘família’ e ‘parentesco’ que,
até então, guiavam o olhar dos pesquisadores nada
mais eram do que crenças folk da sociedade do pesquisador.
Em outras palavras, ao tomar as crenças e os valores de sua
cultura particular (América do Norte e Europa Ocidental)
como parâmetro de observação válido para
toda a humanidade, os antropólogos da primeira metade do
século XX, quase por unanimidade, tinham cometido o pecado
capital da disciplina – etnocentrismo (Schneider
1984, Bestard 1998).
Não bastava mais relativizar ‘a família’,
reconhecendo a enorme variabilidade de formas que esta assumia.
Agora, desgarrando-se dos mapas genealógicos e procurando
entender como seus informantes definiam os indivíduos mais
relevantes de seu universo social, os antropólogos tiveram
de reconhecer que muitos povos não calculam a proximidade
ou distância social conforme os princípios da procriação
sexuada tão valorizada na nossa sociedade. Da mesma forma
que ocidentais consideram o sêmen e o sangue do ato sexual
como vetores de substância compartilhada entre pais e filhos,
há povos que concebem o ato de amamentar, de compartilhar
comida ou mesmo de produzir alimentos juntos como símbolos
de conexão tão (senão mais) poderosos do que
o ato sexual (Carsten 2000). Assim, pesquisadores
citam exemplos como o dos Piró da Amazônia, em que
o vínculo de parentesco é constituído no ato
de alimentar a criança. Do ponto de vista dos Piró,
é a memória do processo alimentício que informa
a definição de vínculos. Nesse contexto, a
informação sobre origens fisiológicas traz
um conhecimento de interesse secundário. Não é
essa a informação que vai informar a percepção
do indivíduo sobre seu lugar no mundo, sobre as relações
que serão mais significativas para sua identidade. (12)Tais
dados apóiam o novo consenso de que a proximidade genealógica
é apenas um e nem sempre o mais importante dos critérios
usados para calcular pertencimento ao grupo ‘primário’.
Essa discussão se torna particularmente relevante quando
direcionada, como em boa parte da literatura atual sobre parentesco,
para o questionamento das categorias ocidentais de conhecimento.
Strathern (1999), em um recente estudo
sobre o conhecimento de parentesco (kinship knowledge),
argüi que, no contexto euro-americano, esse tipo de conhecimento
está intimamente ligado à identidade pessoal. Para
desenvolver seu raciocínio, faz uma distinção
entre, por um lado, “informação reguladora”,
que se acrescenta ao conhecimento já existente, aumentando
ou, pelo menos, esclarecendo opções práticas,
e, por outro, “informação constitutiva”,
que implica uma redefinição total do jogo. Para ilustrar
o primeiro tipo, mostra como, em certos casos, a informação
fornecida pelo teste de DNA serve para converter um tipo de conhecimento
em outro (a suspeita de paternidade alegada pela mãe vira
fato), validando uma versão da realidade que já existia
e ampliando as opções, por exemplo, da criança
assim legitimada. Cita outros casos, no entanto, em que um homem
faz uso do teste para negar a paternidade de crianças que
vem criando há anos. Aqui, Strathern sugere que a revelação
de certa informação provoca uma reconfiguração
total das relações: “[...] uma informação
pode automaticamente obliterar outra. Não se trata de escolhas.
Os efeitos são embutidos na informação”
(Strathern 1999: 75).
No sistema euro-americano, dada a centralidade do momento do coito,
qualquer informação sobre a concepção
provoca uma perturbação imediata nas relações
e na identidade de um indivíduo. Este pode ter a opção
de recusar certa informação (tem o direito de não
saber), mas, uma vez revelada, ele não controla mais os efeitos
da informação: “a informação constitutiva
não pode ser selecionada conforme sua relevância ou
aplicabilidade. Ou se sabe ou não se sabe” (Strathern
1999: 82). O fato de ter efeitos praticamente inevitáveis
torna a tecnologia e, ainda mais, os especialistas da revelação
poderosos. Assim, investindo contra as máximas liberais quanto
à virtude auto-evidente da livre circulação
de informação e questionando o imperativo moral exigindo
a revelação (disclosure) de praticamente
tudo, Strathern faz um pleito provocador em favor da (possibilidade
de) ‘recusa de informação’.
Pode objetar o leitor que, no caso brasileiro, essas inquietações
são pouco conseqüentes diante das benesses potenciais
esperadas da identificação paterna por via do teste
de DNA. E, certamente, na grande maioria de casos que são
finalmente julgados na Vara de Família, o jovem consegue
colocar na certidão o nome de algum ‘pai’. Ainda
mais, se este for menor de idade, o juiz mandará o pai pagar
uma pensão modesta (em torno de 30% do salário mínimo).
Entretanto, como lembram diversos pesquisadores (Scott
1996, Arilha 1998, Fonseca
2003), o papel do pai-provedor é um ideal que
muitos homens da classe trabalhadora nunca conseguiram atingir.
Por causa de condições instáveis de trabalho,
muitos deles não poderiam dar um apoio financeiro a seus
filhos, mesmo que quisessem.
Ao que tudo indica, na ausência de uma mínima relação
anterior entre pai e filho, a paternidade legal nem sempre traz
conseqüências no plano prático – no que
diz respeito ao sustento material – e muito menos no plano
afetivo. Nada garante que o homem declarado pelo tribunal como o
pai de certa criança cumpra seu compromisso paterno. Há
de se convir: a afirmação de um fato biogenético,
o cumprimento de uma lei e o desenvolvimento de uma relação
social são processos distintos. Nesse caso, é difícil
conceber a investigação de paternidade como medida
para o combate à pobreza. (13)
Sem nem essa vantagem garantida, o uso crescente do exame de DNA,
com o conseqüente realce de ‘verdades biológicas’
na determinação legal de relações familiares,
pode estar abrindo uma caixa de Pandora – com resultados ainda
por serem vistos (14).
Certamente, o ciúme e a desconfiança não são
elementos novos na relação entre parceiros de uma
relação amorosa. Os clássicos, de Shakespeare
a Machado de Assis, nos ensinam que dúvidas masculinas quanto
à paternidade de uma criança existem há muito
tempo. No entanto, sugiro que houve uma sutil modificação
introduzida nessas relações pela grande importância
atribuída à nova tecnologia, o teste de DNA de paternidade.
Hoje, com a crescente importância legal do teste de DNA, e
a possibilidade de saber ‘a verdade real’, homens e
mulheres não têm mais a tranqüilidade para negociar
sua própria verdade. Esta – a realidade supostamente
objetiva – é dada fora deles por processos bioquímicos,
nos laboratórios médicos. Não são mais
os fatos da vida social (relações, afetos)
que definem o ‘verdadeiro’ pai, mais sim os fatos biológicos
que ‘revelam’ os comportamentos. Com isso, os homens
têm medo de uma situação ‘fora de lugar’
e, em especial, que venha à tona, na opinião pública,
que foram ‘enganados’, que tenham comido 'gato por lebre’,
que tenham aceitado, sem saber, a paternidade apenas social.
Desde a década de 1960, existem outros testes bastante seguros
para verificar vínculos familiares. No entanto, o teste de
DNA – com sua muito badalada precisão de 99,9999% –
traz uma suposta certeza. Enquanto observava a coleta de sangue,
ouvia uma pessoa atrás da outra perguntar: “É
garantido?” “É definitivo?” “Pode
dar erro?”. E a resposta, dada pelos técnicos: “É
infalível”. Ainda mais significativo, os juizes chamados
a arbitrar a investigação ou negação
de paternidade não perdem mais tempo com testemunhas, indo
em geral direto à prova ‘contundente’ do DNA.
Nossas pesquisas preliminares sugerem que essa ‘certeza’
tecnológica está trazendo para o campo de relações
familiares contemporâneas mudanças imprevistas. Longe
de inspirar maior tranqüilidade, parece que a simples existência
do teste atiça a vontade de saber. Ao que tudo indica, estamos
diante da ‘certeza que pariu a dúvida’. Ao alterar
as próprias premissas das relações familiares,
essa forma de biotecnologia está aumentando a dúvida
que pretende sanar. |
ABREU,
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